sábado, 23 de novembro de 2013

Na falta de psicólogo, a gente escreve no blog

Eu me lembro de quando comecei a morrer. Tinha 11 anos e estava prestes a fazer 12. Aí perdi o meu pai. Mas não foi só isso. Junto com ele eu perdi a "família diferente" que eu costumava dizer com orgulho que tinha, a minha identidade e o resto da minha infância. Mas talvez isso não tivesse sido nada demais. Acontece que eu me lembro também de não ter me permitido sofrer essas perdas como deveria (leia-se precisava). Lembro de sentir muito medo da minha mãe me ver chorando por isso e da dor que isso causaria a ela, que já tinha seus bons motivos pra sofrer sem precisar da minha ajuda. Lembro do pânico que me dava em imaginar que as pessoas poderiam achar que eu estava overreacting, fazendo drama, bancando a órfã da novela. Me dava náuseas. 

Por isso então eu peguei a minha tristeza sem fim, as dúvidas e a raiva imensa do "deus" que tinha deixado uma coisa dessa acontecer e enfiei num lugar tão escondido que só eu podia encontrar quando estava completamente só. Sobrou apenas apatia e um pouco de falsidade que todo mundo chamava de educação. Me acostumei tanto a não falar sobre isso, que até mesmo quando era necessário e eu tentava, não sabia como proceder. Mas quando se tratava da minha mãe, aí que a minha garganta dava um nó e não saía uma palavra sequer. Ainda não suporto olhar nos olhos dela e arriscar tocar nesse assunto, pra não ter que ver nos seus olhos algum resquício de dor. 

O fato é que, uma semana depois [Depois de que? Vamos lá: Depois do acidente de carro numa noite de chuva que fez o meu pai se afogar numa lagoa quando estava voltando do trabalho] eu estava voltando à escola, assistindo aulas e estudando como se nada tivesse acontecido. Por que não, né? "A vida tem que continuar" era o que eu mais ouvia de todo mundo e respondia com um sorrisinho triste de quem, no fundo, não está de acordo. E se eu não quisesse continuar naquele momento? Eu sabia que precisava de um tempo, de pessoas que conversassem comigo ao invés de acreditarem na minha farsa de superação e até me isolar um pouco de vez em quando, mas eu não tive essa opção.

Sem querer usar esses argumentos para justificar um pouco do que eu sou hoje, mas já usando, tenho a forte impressão que tanto sentimento ruim sufocado dentro de mim me fez assim, completamente vulnerável... E quase nunca feliz. Tenho, atualmente, uma ideia muito confusa ao meu próprio respeito; venho perdendo a habilidade de sorrir "educadamente" para as pessoas; me abalo fácil e fortemente como se qualquer acontecimento corriqueiro fosse capaz de me revirar por dentro e trazer à tona tudo que está mal resolvido, culminando no vazio e na falta de vontade de mim mesma.